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sexta-feira, 14 de junho de 2013

A CIDADELA





Comecei a reler um dos melhores livros que já li em toda a vida: A CIDADELA, de Saint-Exupéry.

Minha mãe e eu tínhamos o mesmo gosto pela leitura e se há um setor em que combinávamos perfeitamente era o da literatura. Seus autores prediletos fui descobrindo aos poucos, incentivada por ela e acabei por elegê-los os meus, também.

Vou transcrever aqui apenas os comentários que ela deixou por escrito, à lápis, nas 3 primeiras folhas do livro.

 Na primeira folha, em branco:  "Este será meu livro de cabeceira, a que sempre recorrerei entre um e outro dos que vou ler futuramente".

Na segunda folha: "Leitura para pessoas de grande poder de introspecção, para pessoas extremamente sensíveis e que conseguem extrair de um tonel de uvas repisadas, um cálice de vinho do mais requintado sabor!"

"Se tua cidade se engalana para as festas, se o raio de sol penetra estuante por tua janela, se enfim houver uma atmosfera de euforia no ar, não abra este livro. Reserva-o para dias outonais, acende uma vela votiva, prepara-te como para um ritual, e aí sim, abre-o e envolve-te nele com o espírito puro e silente, para absorveres todo seu encanto!"

Mais abaixo, ainda na segunda folha:"Por favor, acuse o recebimento para eu ficar tranquila. Thanks."

Na terceira folha: "Prepara-te como se foras entrar num santuário. Para absorver as pequenas grandes sabedorias deste livro precisa-se estar com o espírito puro, desligado das atribuições deste mundo, completamente vazio e apto para se admirar com elas como só uma criança se encanta com as coisas mais pequeninas e ao mesmo tempo maravilhosas a que o adulto já viciado e corrompido não tem a capacidade de "ver"."

Nas páginas 19/20 há um trecho onde o autor coloca a mulher como um ser que deve se dedicar a servir o homem, texto difícil de "engolir" por mulheres como minha mãe (incluo-me nisso) que conviveu com um marido machista ao extremo. Talvez por causa de sua mente avançada para seu tempo, mesmo gostando muito deste livro, ela não deixou de marcar a página com a palavra "machista", referindo-se ao que o autor disse.

O livro está cheio de grifos à lápis nos trechos que a impressionaram pela beleza das palavras ali expostas.
Vou salientar apenas o primeiro texto grifado abaixo, para que vejam a profundidade e beleza das palavras de Saint-Exupéry, que morreu num acidente aéreo antes de terminar de escrever este livro:

"Meditei muito tempo sobre o sentido da paz. A paz tão somente deriva dos filhos paridos, das colheitas arrecadadas, da casa até que enfim arrumada. A paz vem-nos da eternidade, em que ingressam as coisas acabadas, perfeitas. Paz dos celeiros cheios, das ovelhas que dormem, dos lençóis dobrados, paz que apenas da perfeição nasce, paz do que se torna oferenda a Deus, uma vez bem feito."

Este livro tem a tradução de Ruy Bello, EDITORA QUADRANTE, São Paulo e  EDITORA ASTER, Lisboa, composto e impresso em 1969.




3 comentários:

Maria Eduardo disse...

Tive conhecimento do seu blogue através do blogue "Um jeito manso" e hoje decidi fazer-lhe uma visita.
Não li o livro "Cidadela", de Saint Exupéry, mas fiquei com vontade de o ler depois de conhecer os comentários deixados por sua Mãe, e que tão gentilmente partilhou connosco.
Obrigada.
Um abraço

sonia disse...

Obrigada por sua visita e comentário tão simpático. Minha mãe tinha uma qualidade que vejo em poucas pessoas. Era uma autêntica apaixonada por literatura, teatro, música e pintura. Graças a ela eu comecei a ler e não parei mais. Esse livro é de emocionar. Se puder, procure-o, deve ter ao menos nos bons sebos aí em Portugal. É bem volumoso! Tem 446 páginas. Um comentário no final do livro feito por minha mãe: “esse livro teria continuado, com tanta sabedoria e beleza caso a morte não impedisse Saint Exupéry de fazê-lo...”

Alexandre Kovacs disse...

Todas as citações muito lindas na sua postagem, literatura e vida se confundindo. Memórias e sentimentos de uma leitora, preservadas nas páginas do livro, uma leitora que será sempre lembrada pela filha, emocionante mesmo. Grande Abraço, Kovacs